Pessoas que tiveram a doença e especialistas falam sobre receios que surgem logo após a suspeita de infecção pelo vírus monkeypox
Faz mais de dois meses desde o primeiro caso de varíola do macaco (monkeypox) no Brasil, mas agora, com cerca de 3.000 infectados, começa-se a perceber que os impactos da doença em quem é acometido vão além das lesões de pele, embora estas sejam motivo de preocupação permanente dos pacientes.
“Tive algumas bolhas na mão e no ombro. Posso dizer que meu caso foi leve, mas meu maior medo era acordar um dia e ter no rosto, ficar com alguma marca, uma cicatriz feia. Passei vários dias achando que iria ficar cheio de bolhas”, conta Márcio, de 31 anos, que preferiu não ter o sobrenome divulgado.
Ele trabalha em casa e pôde lidar com o isolamento de 20 dias sem muitos problemas. Não foi o caso de outro homem ouvido pelo R7.
Henrique (nome alterado a pedido do entrevistado), de 28 anos, é comissário de voo e recebe um piso salarial que é incrementado com a remuneração pelas horas voadas no mês, além de diárias por pernoites em outras cidades.
Sem poder trabalhar por quase quatro semanas, a empresa o encaminhou para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), que fica responsável pelo pagamento dos dias de trabalho que extrapolam os 15 primeiros dias de atestado médico.
“Tem sido horrível, porque a doença em si já é meio traumática, você lida com um turbilhão de emoções. Aí, quando acha que o pior já passou, ainda tem essa parte de trabalho. Eu não tinha economias para passar tanto tempo assim sem trabalhar. Sempre fui muito independente, mas agora precisei pedir dinheiro aos meus pais. Isso tudo me deixou muito ansioso”, conta.
Uma das características epidemiológicas da varíola do macaco neste momento, no Brasil e no mundo, é a predominância entre HSH (homens que fazem sexo com homens). Segundo o Ministério da Saúde, aqui, este grupo representa 98% dos casos.
Isto não significa, em hipótese alguma, que os demais não devam estar atentos. Trata-se de uma doença que se transmite por contato de pele e de mucosa, o que inclui atividade sexual, abraços e beijos, por exemplo.
Já foram registrados, em São Paulo, casos de monkeypox em grávidas e crianças, sendo que uma delas pegou ao abraçar o tio, que não sabia que não sabia que tinha sido infectado.
Márcio foi diagnosticado na metade de julho, duas semanas após participar de uma festa em que vários frequentadores, inclusive ele, estavam sem camisa.
“Quando eu peguei, já se falava que era uma doença que estava circulando muito entre os gays. [Após o resultado] eu sempre ficava pensando no que as pessoas pensariam de mim, que me julgassem, como se eu tivesse feito algo para merecer isso”, lamenta.
A associação equivocada da doença com determinada orientação sexual é mais um fator que contribui para sobrecarregar o estado emocional dos pacientes, avalia o psiquiatra Adilon Harley Machado, do Espaço Arquétipo, em São Paulo.
“A nova varíola, nome cada vez mais aceito, tem baixa transmissão e baixa virulência, com poucos casos graves. Entretanto, sua morbidade se dá na saúde mental devido ao estigma e à possibilidade de cicatrizes inestéticas das lesões de pele. Além disso, há o afastamento do trabalho, o conhecimento do diagnóstico por pessoas próximas e associações problemáticas entre a doença e orientação e/ou comportamento sexual dos infectados. Todos esses fatores podem agravar quadros de depressão e de ansiedade, ou mesmo servir de gatilho.”
O infectologista Ralcyon Teixeira, diretor da Divisão Médica do Instituto de Infectologia Emilio Ribas, hospital que na última semana atendeu metade de todos os casos suspeitos de varíola do macaco na cidade de São Paulo, revela que os pacientes já ficam apreensivos no pronto-socorro.
“No atendimento em si, às vezes, tem muita angústia para saber se é ou não é. Existe uma ânsia pelo resultado. Hoje, quem ficou responsável pelo resultado [por informar ao paciente] – e até para retomar o atestado e ver como a pessoa está – são as Unidades Básicas de Saúde. Às vezes, tem paciente que acaba voltando aqui, ligando…”
No Estado de São Paulo, o Instituto Adolfo Lutz processa todos os exames realizados na rede pública. O resultado sai entre dois e três dias.
Fonte: R7.COM